21.10.05

Pôr-do-sol

Sentada na murada que separa a rua do mar, pensamentos rodopiavam em minha mente. Na verdade eram eles, e não a doce maresia, que mais me despenteavam. O fim de tarde estava lindo, com um sol a se derreter manso no encontro com as águas. Lembrei-me de quando ainda era criança e passava as tardes a recolher conchas na beira da praia. Doces tardes consumiram-se assim. Quem dera eu pudesse voltar para elas, num piscar de olhos, ou num rodopio de calcanhares. Ao lembrá-las, elas agora me parecem um filme muito antigo. Parece que envelheci mais ao lembrar daquele tempo. Naquela tarde, com um cigarro numa mão e um punhado de desejos na outra, olhava o movimento das ondas, levando ilusões para longe e trazendo para perto desejos suicidas. Já me via entrando de roupa no mar, a andar em linha reta e prender a respiração...Não me movi. O álcool, consumido em larga escala por aquelas tardes e noites, agia ininterruptamente. Doía-me no peito uma transa inconseqüente, um amor desprevenido, desajustado. Renegado, não por indiferença, mas por incoerência de tempos. Sempre o tempo. Ainda assim me mantive imóvel. A tarde estava linda e eu debulhava-me em lágrimas amargas enquanto o sol partia no horizonte.

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